Os pesquisadores identificaram a nova variante em amostras de sangue de pessoas soropositivas para o vírus HIV do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Bahia.
A variante é resultado da mistura genética de dois tipos de HIV amplamente difundidos no Brasil, chamados de B e C, que podem ter se combinado no organismo de um paciente e gerado padrões diferentes dos já conhecidos.
Durante a investigação, os cientistas analisaram uma amostra genética coletada em 2019 de um portador do HIV em tratamento em Salvador, na Bahia, e identificaram fragmentos dos dois tipos diferentes do vírus.
As sequências genéticas encontradas foram, então, comparadas com informações registradas em bancos de dados científicos, o que revelou a existência de outras 3 ocorrências de padrões semelhantes espalhadas pelo Brasil. Com esses resultados, a equipe realizou um estudo de parentesco que indicou uma conexão entre as 4 amostras e possibilitou a classificação da nova variedade do vírus HIV, a recombinante CRF146_BC.
Como essa variante do HIV surgiu?
Segundo Joana Paixão Monteiro-Cunha, autora da pesquisa, o mais provável é que essa nova variedade tenha surgido em um paciente infectado, ao mesmo tempo, com os tipos B e C do vírus.
“Quando duas variantes diferentes infectam a mesma célula, podem se formar híbridos durante o processo de replicação do vírus e, destes, surgem os recombinantes”, explica a pesquisadora.
Ela também esclarece que é possível que um único portador tenha iniciado a transmissão do novo tipo no Brasil, que já foi detectado em 3 estados. “Nosso estudo mostrou que as variantes encontradas nas diferentes regiões geográficas são descendentes de um mesmo ancestral. Assim, é possível especular que ela já está amplamente disseminada no país”, alerta.
Transmissão e infecção
Separadamente, os subtipos B e C do HIV são responsáveis por cerca de 80% das infecções no Brasil, sendo a variante B a mais difundida em todas as regiões do país. Mesmo com essa prevalência, a autora destaca que a maior parte do material genético da nova variante é herdada do tipo C.
“Nós avaliamos muitas outras formas recombinantes que envolvem os dois subtipos e observamos que, na maioria delas, também predominam sequências genômicas do subtipo C”. De acordo com a pesquisadora, isso pode indicar uma pressão seletiva para a manutenção da variante C, possivelmente devido a vantagens adaptativas ou replicativas presentes nesse tipo.
Embora novos estudos sejam necessários para verificar diferenças entre a nova variante e os tipos C e B nas taxas de transmissão e progressão da infecção para a Aids, Monteiro-Cunha explica que não há evidências de que o tratamento contra o vírus precise ser modificado. “Parece que os subtipos de HIV-1 não apresentam grandes diferenças na resposta à terapia antirretroviral”, comenta.
As formas recombinantes de HIV são responsáveis por cerca de 23% das infecções ao redor do globo.
Desde 1980, mais de 150 misturas entre as variantes B e C já foram descobertas no mundo. Nesse cenário, a pesquisadora salienta que é essencial manter os esforços para investigar esses vírus. Sua equipe deve continuar investigando e monitorando o surgimento de novas formas do HIV para auxiliar na vigilância da disseminação desse vírus — o que impacta, também, no controle da doença causada por ele.